AJS vence ação contra a FINEP, que obrigava Sindicato a não conferir contas de empregados do programa de Demissão Assistida

O Juiz do Trabalho Marcelo Segal deu parecer favorável ao Sindicato dos Bancários do Município do Rio de Janeiro em função de ação impetrada pela AJS – Cortez e Advogados Associados em favor dos funcionários demissionários daquela instituição. 
O Sindicato, como órgão responsável pela homologação de demissões de empregados inscritos no Programa de Demissão Assistida da FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), tem por obrigação conferir as contas de valores a serem pagos aos empregados inscritos neste processo de demissão. Contudo, o Sindicato dos Bancários recebeu orientação de que não deveria conferir os pagamentos, sob a pena de o empregado ter de retornar, a contragosto, ao trabalho e ser desabilitado do Programa de Demissão Assistida.
Entendendo estar sob limitação de suas funções como órgão classista, o Sindicato dos Bancários entrou com ação para anular a cláusula que restringia sua atuação em favor dos empregados demissionários e venceu a causa, defendida pela AJS. 
A FINEP foi, ainda, orientada a pagar multa de R$ 50 mil por funcionário que fosse proibido de participar do processo de Demissão Assistida, por ter suas contas aferidas pelo Sindicato dos Bancários.

Leia a defesa da ação, em sua íntegra, a seguir:

PROCESSO: 0011320-63.2013.5.01.0026
CLASSE: AÇÃO TRABALHISTA – RITO ORDINÁRIO (985)
RECLAMANTE:
SIND DOS EMPREG EM ESTAB BANCARIOS DO MUNICIPIO DO RJ
RECLAMADO:
FINANCIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS – FINEP

SENTENÇA
PJe-JT
O SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS
BANCARIOS DO MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO move reclamação trabalhista com pedido
de tutela antecipada em face de FINANCIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS – FINEP
pelos motivos expostos às fls. 3/12, postulando as parcelas e títulos elencados
no nos itens “a” a “e” da exordial. Documentos de fls. 13/76.
Decisão às fls. 77, deferindo a antecipação de
tutela, revista pela decisão liminar em mandado de segurança de fls. 98/104.
Resposta escrita sob a forma de contestação às
fls. 110/118, na qual a parte acionada argui preliminar e, no mérito, resiste
in totum aos pleitos formulados. Documentos de fls. 119/363.
Audiência à fl. 374.
Conciliação rejeitada.
As partes declararam não ter outras provas a
produzir.
Proposta conciliatória final rejeitada.
Razões finais orais remissivas
Tudo visto e examinado.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL
A preliminar em exame não é muito clara – não
sei se a acionada refere-se à falta de interesse de agir, pois diz que a
ausência de interesse ocorreria porque 46 ex-empregados já aderiram ao plano e
saíram com festa patrocinada pela ex-empregadora.
Seja como for, é evidente que a matéria posta
em juízo é relevante e, há sim, interesse do sindicato em ver declarada a
nulidade de cláusula que afeta indiretamente a sua atuação, como adiante se
verá.
Então, imaginando-se que a preliminar verta
falta de interesse de agir, e considerando-se que há necessidade, utilidade
adequação da via eleita, tenho que a demanda é viável.
Rejeito.
DO MÉRITO
O sindicato autor investe vigorosamente contra
2 itens do Programa de Demissão Assistida da ré, advogando que eles ferem a
liberdade do sindicato, transformando-o em mero homologador,  já que a aposição de ressalva nulificaria a
adesão formulada pelo trabalhador ao plano.
Pois bem, a beleza do direito está na
possibilidade de visões diferenciadas sobre o mesmo tema, sem que nenhuma delas
esteja necessariamente errada.
Esse caso retrata uma dessas hipóteses.
É verdade que não há (nem poderia haver)
qualquer determinação na adesão do plano de desligamento voluntário que se
dirija ao sindicato – ele não está obrigado a fazer ou deixar de fazer
absolutamente nada -, mas há itens prevendo que, caso seja aposta ressalva pelo
sindicato no momento da homologação, a adesão feita pelo trabalhador perderá o
efeito e ele terá de retornar a trabalhar (!?).
Uma simples e inocente ressalva, portanto,
ditará o destino de um trabalhador.
Veja-se a situação concreta que potencialmente
disso pode advir: o empregado, que depois de bastante reflexão (haja vista
todas as implicações disso em sua vida) resolve aderir ao plano de desligamento
incentivado, tem a data para homologação designada no sindicato.
Lá chegando, ao conferir as contas, o sindicato
entende que há alguma divergência ou diferença e, conforme é seu dever, deve
lançar a ressalva respectiva – e muito reclamam da inação dos sindicatos na
defesa dos trabalhadores, mas curiosamente neste caso critica-se uma postura
cuidadosa e ativa do sindicato na conferência das contas apresentadas.
Ora, pelas regras impostas pela demandada,
sendo feito a ressalva, então o termo de adesão, como que por encanto, perde o
efeito e o empregado precisa retornar ao trabalho.
Então, desnecessário maior esforço de
raciocínio para concluir-se que teremos um impasse dramático entre o empregado
e o seu sindicato: este querendo lançar a ressalva por valores ou direitos
supostamente não adimplidos, entendo estar no seu dever de cuidado e cautela;
aquele, exigindo que o sindicato não lance qualquer ressalva, sob pena dele ser
banido do programa de demissão voluntária.
Então, obviamente que a solução urdida pela ré,
malgrado (repito) não trazer qualquer obrigação para o sindicato nem limitar a
sua atuação – já que se o sindicato é aguerrido, como parece, tanto assim que
veio a juízo postular a nulidade das cláusulas, levando a crer que lançaria a
ressalva com ou contra a vontade do trabalhador, já que a sua preocupação deve
ser com a garantia da classe como um todo, e não atender a interesses
particulares momentâneos -, traz cláusula de duvidosa legalidade, com ampla
chance e poder de fomentar a discórdia e o confronto entre trabalhadores e seu
sindicato, tudo patrocinado por uma condição imposta a uma manifestação de
vontade que me parece bastante questionável.
Por outro lado, quero deixar bem claro, como já
o fiz em audiência, que com ou sem ressalva, os trabalhadores que se sentirem
lesados ou que tiveram algum direito supostamente violado na vigência da
interlocução social, certamente poderão valer-se do Poder Judiciário, já que a
homologação é um procedimento extrajudicial e, por conseguinte, não é coberto
com o manto da coisa julgada.
Isso, num primeiro momento, me fez concluir que
essa ação, em que pese a excelência dos patrocínios, teria na prática pouca
consequência jurídica, senão os inafastáveis e inevitáveis confrontos que
adviriam de homologações nas quais o sindicato verificasse lesão ou diferença,
quisesse fazer a ressalva respectiva e tivesse a objeção (quiçá violenta) dos
empregados candidatos ao Programa.
Contudo, melhor refletindo, o caso vai além
disso. Indiretamente se busca campo fértil para confronto de sindicato de
empregado e trabalhadores, a par do ato jurídico em questão, mesmo no âmbito do
Direito Material, ser a meu sentir ilegal porque, ainda que (me repetindo) a
ressalva não seja óbice à reivindicação das parcelas (ainda que em algum lugar
e momento haverá um juiz do Trabalho que usará a Súmula 330 do TST para dizer
que o empregado nada mais pode fazer porque não houve ressalva no seu TRCT),
não se pode admitir que essas cláusulas permaneçam no mundo jurídico, pois
certamente serão no futuro sofisticadas para, cada vez mais, tornar os
sindicatos reféns do capricho e vontade dos empregadores.
Os itens 7.2 e 7.3 do Programa de Desligamento
Assistido da Reclamada, e correlatos itens “f” e “g” do respectivo termo de
adesão, são ilegais e atraem a aplicação do artigo 9º da CLT porque
indiretamente cerceiam a liberdade do sindicato dos empregados no seu
poder/dever de analisar as contas e lançar as ressalvas correspondentes no TRCT
– ainda que, obviamente, isso não vincule o Poder Judiciário.
Em razão disso, declaro formalmente a nulidade
dos itens 7.2 e 7.3 do Programa de Desligamento Assistido da Reclamada, bem
como dos itens “f” e “g” do respectivo termo de adesão, cominando multa de R$
50.000,00 por trabalhador que, desejando aderir ao Programa de Desligamento,
for posteriormente impedido de fazê-lo porque o sindicato pretenda lançar
ressalva do TRCT – pois essa condição foi, ao menos de forma precária,
nulificada pela sentença.
Defiro a tutela antecipada para tornar
imediatamente operante esta decisão.
Informe-se o teor desta decisão, com a máxima
urgência, ao Eminente Relator do mandado de segurança
0010027-05.2014.5.01.0000, para que S. Excelência verifique se é caso de
aplicação da Súmula 414, III, do TST:
Súmula 414, III – A superveniência da sentença,
nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que
impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar).
DOS DANOS MORAIS
Malgrado a conclusão acima, não verifico no ato
questionado qualquer dano moral ao sindicato que, neste ponto, exagera.
A situação indesejável está sendo remediada.
Improcede.
DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Não versando a lide sobre relação de emprego,
impõe-se a concessão de honorários – Súmula 219, III, parte final, do TST.
Defiro o pagamento de honorários advocatícios,
na razão de 10% sobre o valor da causa, em favor do sindicato.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, rejeito a preliminar
suscitada e, no mérito, julgo PROCEDENTE EM PARTE os pedidos para nulificar os
itens 7.2 e 7.3 do Programa de Desligamento Assistido da Reclamada, bem como
dos itens “f” e “g” do respectivo termo de adesão, cominando multa de R$ 50.000,00
por trabalhador que, desejando aderir ao Programa de Desligamento, for
posteriormente impedido de fazê-lo porque o sindicato pretenda lançar ressalva
do TRCT, além de condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, na
razão de 10% sobre o valor da causa, em favor do sindicato. IMPROCEDENTES os
demais pedidos.
Custas de R$ 800,00 sobre R$ 40.000,00, pela
ré.
Prazo de cumprimento de 8 dias.
Intimem-se e oficie-se ao Relator do
mandado de segurança.
 Marcelo Segal

Juiz do Trabalho


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *