Itaú é condenado a pagar 7ª e 8ª horas extras a Gerente de Relacionamento

Uma sentença da 49ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região, deferiu as horas extras excedentes da 6ª diária (7ª e 8ª hora), com adicional de 50% a uma bancária, por entender que o cargo de Gerente de Relacionamento Itaú Uniclass I estava enquadrado no caput do art. 224 da CLT, já que NÃO detinha grau de confiança maior que os demais bancários.

Além disso, o requerimento de gratuidade de justiça também foi deferido, mesmo tendo o processo sido ajuizado após a reforma trabalhista, por conta da declaração de hipossuficiência e da assistência sindical.

Veja a decisão:

Na peça de ingresso, alega a autora que, durante o período imprescrito, laborou de segunda a sexta-feira, das 09:00 às 18:00 horas, com intervalo de uma hora para refeição e descanso. Todavia, aduz que a ré lhe impôs uma jornada contratual de 08 horas diárias, sem que houvesse respaldo fático para excepcioná-la da jornada de seis horas da categoria bancária (caput do art. 224 da CLT). Sustenta, com isso, que houve fraude ao requisito subjetivo estabelecido no § 2º do artigo 224 da CLT, uma vez que, mesmo após receber o rótulo de um cargo supostamente de “chefia/confiança”, não foi afastada das rotinas bancárias que sensibilizaram o legislador a normatizar a redução da jornada da categoria.
Sendo assim, postula a autora o pagamento das horas extras além da 6ª diária, com os reflexos no repouso semanal remunerado, inclusive aos sábados (na cláusula 8ª, § 1º das convenções coletivas), bem como a integração para fins de cálculos nos saldos e depósitos do FGTS, nas
férias acrescidas de 1/3, nos 13º salários, na base de cálculo para pagamento do adicional por tempo de serviço, gratificação semestral, PLR, comissão de cargo e gratificação de função. Em sua defesa, a ré confirma a jornada de trabalho alegada pela autora, aduzindo que a mesma estava enquadrada na exceção prevista no artigo 224, §2º, da CLT, uma vez que, exercendo cargo de confiança, recebia gratificação de função superior a 1/3 do seu salário. Salienta que, no exercício das funções de Gerente de Relacionamento Itaú Uniclass I, atuava com autonomia e fidúcia superiores às depositadas nos cargos de base, visto que suas atividades exigiam, entre outras habilidades, o gerenciamento de contas de clientes, o profundo
conhecimento do negócio, tomada de decisão, habilidade de negociação, bons conhecimentos de crédito e operações de tesouraria e fundos de investimentos, persuasão e capacidade analítica, sendo desnecessária a gestão de pessoas.

Desse modo, aduz que a autora desempenhava atividades dentro da estrutura da agência, fundamentais ao seu funcionamento e à própria atividade econômica da instituição financeira, verdadeiro elo entre os clientes e o Banco, podendo, pelo mau exercício de seus poderes, causar à ré e a seus clientes graves prejuízos, inclusive, em razão da relevância dos poderes e dos acessos conferidos ao Gerente de Relacionamento Itaú Uniclass.
Em relação aos cartões de ponto, embora não impugnados, assevera que os mesmos retratam de forma fidedigna a jornada cumprida pela parte autora, inclusive jornada extraordinária, que poderia ser compensada com entradas tardias, saídas antecipadas e até emendas com
finais de semanas e feriados, conforme Acordo de Compensação de Jornada e cartões de ponto anexos. Frisa, ainda, que as horas extras não compensadas foram corretamente pagas, conforme comprovam as fichas financeiras adunadas aos autos. Vejamos.
No que tange ao cargo de confiança, de acordo com a doutrina trabalhista, a categoria dos empregados bancários divide-se em dois grupos distintos.
O primeiro é constituído pelos empregados que exercem funções cujas atividades implicam em confiança direta do empregador, independentemente de possuírem ou não poderes de mando, gestão ou fiscalização, porém com o exercício de atribuições de maior confiança inseridas na estrutura do banco. A jornada de trabalho desses empregados é de oito horas, fazendo jus, portanto, a horas extras acima da 8ª diária, com a condição de que percebam gratificação superior a 1/3 de seu salário básico, em conformidade com o artigo 224, §2º, da CLT. O segundo grupo constitui-se dos empregados cujas atribuições personificam o empregador, atuando nos seus interesses e mesmo como se proprietários fossem. Deste modo, eventuais erros cometidos por estes empregados têm o poder de, além de causar grandes prejuízos, colocar em risco a atividade fim da empresa ou mesmo a sua existência no mercado. Essas características, aliadas à evidência de que detêm maiores responsabilidades, elevadas remunerações ou gratificações de
cargo, culmina por distingui-los dos demais colaboradores e afastam o direito ao percebimento de quaisquer horas extras.

[…]

A controvérsia dos presentes autos remete ao primeiro grupo. Assim, inicialmente, há que se verificar se a autora, na função de Gerente de Relacionamento Itaú Uniclass I, esteve ou não sujeita à exceção do artigo 224, §2º, da CLT. Registre-se que, ao alegar que a obreira exercia cargo de confiança, fato impeditivo da pretensão, a ré atraiu para si o ônus da prova (art. 818, II, da CLT e art. 373, II, do Novo CPC/2015).
Conforme salientado, além da fidúcia especial, para que se configure a exceção estabelecida no §2º do art. 224 da CLT é imprescindível que haja o pagamento de gratificação de pelo menos 1/3 (um terço) do salário do cargo efetivo, o que se verifica nos demonstrativos de ID 8d77eab.
Todavia, no caso em apreço, o conjunto probatório constante dos autos evidencia que a autora não possuía grau de confiança maior que os demais funcionários. Exemplo disso é a própria descrição do cargo de ID 5f982c0, juntada pela própria ré, em que se demonstra claramente que as atividades desenvolvidas pela obreira não representam qualquer risco aos negócios do banco, apenas podendo analisar, cadastrar e liberar operações de crédito dentro de seu nível de alçada, dentre outras tarefas, in verbis:

DESCRIÇÃO CARGO:
“Estreitar o relacionamento, oferecer produtos e serviços disponíveis no segmento em que atua conforme porte da carteira, perfil e necessidades do cliente. Assegurar a adoção dos padrões e normas de qualidade de atendimento e a satisfação dos clientes enfatizando a atuação ética e transparente. Promover oportunidades de negócios mediante análise, estudo e prospecção da base de clientes. Dar suporte e atendimento ao cliente na solução de problemas, abertura de contas e conferência de documentos. Realizar contatos com os clientes constantes de sua respectiva agenda de relacionamento. Gerenciar a carteira de clientes efetuando o acompanhamento dos resultados obtidos definindo estratégias de atuação, mantendo-os atualizados com relação aos produtos e serviços disponibilizados. Analisar, cadastrar e liberar operações de crédito dentro de seu nível de alçada. Ausência de Risco”. Ademais, a referida documentação comprova que o Gerente de Relacionamento ITAÚ UNICLASS I não possui assinatura autorizada, o que contradiz o documento de ID 9038ea7 (assinatura autorizada), anexado pela própria ré.
Outrossim, as propostas de negócios (ID acb691a) e as propostas de abertura de conta (ID cab589b) tampouco fazem prova da alegada fidúcia diferenciada depositada na autora. Revelam justamente o oposto: que a obreira deveria submeter as aludidas propostas à prévia aprovação de seus superiores hierárquicos. Nesse ponto, conforme bem ressaltado em manifestação de ID 3c5d4dc, a proposta adunada sob ID acb691a – Pág. 2 foi recusada pela Sra. Soraia de Freitas, ao passo que a proposta de ID acb691a – Pág. 1 foi aprovada com alterações.
De igual modo, os documentos intitulados “ressarcimento a clientes” (ID 5ef06bd), todos de pequenos valores, não são suficientes para comprovar que a obreira exercia cargo de confiança, sendo certo que tal operação já era pré-aprovada pela ré, conforme o nível de alçada da autora.
Além disso, os cheques administrativos de ID 53f4eee se encontram assinados pela demandante e pela Supervisora Operacional Suenia Rodrigues da Silva, consoante bem salientado pela parte autora em suas manifestações, o que afasta, mais uma vez, o elevado grau de fidúcia e autonomia alegado pela ré.

[…]

Sendo assim, é de se reconhecer o direito às horas extras acima da 6ª diária, nos termos do art. 224, caput, da CLT. Vale ressaltar que, apesar de a autora perceber, a título de gratificação de função, importância superior a um terço do salário do cargo efetivo, como determina o art. 224, § 2º, da
CLT, esta não visava remunerar a maior fidúcia do cargo, mas sim a complexidade dos serviços inerentes à função desempenhada pela obreira, motivo pelo qual não há que se falar, também, em compensação desse valor. No que concerne aos registros de horário, ressalta-se que a autora não impugnou os cartões de ponto adunados aos autos, razão pela qual os reputo idôneos, devendo prevalecer a jornada de trabalho ali consignada. Desse modo, considerando que a autora se encontra enquadrada no caput do artigo 224 da CLT, conforme fundamentado alhures, defiro as horas extras excedentes da 6ª diária (7ª e 8ª hora), com adicional de 50%, observando-se a jornada consignada nos cartões de ponto adunados pela ré.